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Eleições presidenciais de 2024: Incertezas, third parties e o poder do voto latino

João Felipe Ronqui de Carvalho | 28/03/2024 09:13 | Análises

A eleição presidencial dos Estados Unidos em 2024 está programada para começar em 5 de novembro de 2024, com os candidatos mais prováveis sendo o desafiante Donald Trump, representando o Partido Republicano, e o atual presidente Joe Biden, representando o Partido Democrata. A avançada idade de ambos os candidatos, 78 e 81 anos respectivamente, na data da eleição, juntamente com a insatisfação em relação aos seus mandatos anteriores (2017-2020 e 2021-2024, respectivamente), aumenta a incerteza entre os eleitores sobre qual candidato prevalecerá, além de potencializar os votos para os third parties, candidatos que não são vinculados a nenhum dos dois grandes partidos e podem aparecer como terceira via ou votos de protesto. Essa incerteza é ainda mais acentuada nos estados-chave, que historicamente não estão vinculados a um partido específico. Como observamos durante as eleições de meio de mandatoem 2022, pequenas mudanças de votos nesses estados podem levar à vitória de um partido sobre o outro no panorama geral da nação. Em Nevada, um desses estados-chave, os eleitores de origem latina representam 20% do eleitorado e, diferente das eleições presidenciais de 2020 e legislativas de 2022, não é garantido que o apoio histórico latino ao Partido Democrata continue.


Incertezas e instabilidades políticas: alta rejeição nos dois candidatos mais bem cotados.


As eleições presidenciais de 2020 entraram para a história da política norte-americana por uma série de razões significativas. Tanto o vitorioso Joe Biden quanto o segundo colocado Donald Trump conquistaram as duas maiores quantidades de votos populares registrados até então em uma eleição presidencial. Ademais, a pandemia global que teve início no começo do ano pode ter influenciado algumas escolhas eleitorais, com possíveis mudanças de votos decorrentes da insatisfação com a abordagem política de Donald Trump em relação à saúde pública. Além disso, o resultado da eleição foi acompanhado pelo controle democrata na Câmara dos Deputados[1] e pelo controle republicano no Senado[2].


De maneira semelhante, as eleições de 2024 estão destinadas a ser marcadas por anomalias. Com uma taxa de aprovação de 39,6%, a mais baixa para o início do quarto ano de mandato presidencial no século, de acordo com dados do FiveThirtyEight, Joe Biden enfrenta um cenário incerto em relação à sua reeleição. Esta baixa aprovação está intimamente ligada à persistente alta inflação de 2022, que ainda afeta os cidadãos americanos, e, mais recentemente, à crescente desaprovação devido aos fundos de ajuda bilionários concedidos à Ucrânia e Israel em meio aos conflitos em curso, além de outros fatores.


Mesmo assim, os efeitos negativos do mandato presidencial de Donald Trump ainda ecoam entre os cidadãos dos Estados Unidos. Sua abordagem agressiva na política imigratória, personalidade controversa e comportamento abrasivo continuam a contribuir para uma considerável taxa de rejeição à sua candidatura, aumentada pelos processos judiciais que enfrenta no país. Um dos casos mais significativos para a presente análise, o incidente do Capitólio dos EUA e as questões em torno da eleiçãode 2020, concentra-se na investigação sobre se Trump conspirou para alterar os resultados eleitorais, mobilizando uma multidão para invadir o Congresso em 6 de janeiro de 2021, numa tentativa de subverter o processo democrático. As acusações incluem conspiração para cometer fraude eleitoral e conspiração contra os direitos dos cidadãos. Trump nega qualquer irregularidade, enquanto o aguardo da Suprema Corte para uma decisão sobre seu recurso torna o desfecho do julgamento incerto. As possíveis penalidades, que vão desde multas até 20 anos de prisão, pairam sobre o ex-presidente.


Um desenvolvimento significativo nesse processo surgiu nos estados do Colorado e Maine, onde um grupo de eleitores iniciou um processo argumentando que o envolvimento de Trump no ataque ao Congresso o desqualifica para concorrer à presidência, conforme estabelecido na Seção 3 da 14ª Emenda, que proíbe a candidatura de indivíduos envolvidos em insurreições ou rebeliões. Tanto o Colorado quanto, posteriormente, o Maine, invocaram essa cláusula para declarar Trump inelegível para concorrer em seus territórios. Após a Suprema Corte do Colorado confirmar a violação de Trump à Emenda, a equipe jurídica do ex-presidente recorreu à Suprema Corte dos Estados Unidos. A decisão final tomada pela Suprema Corte dos Estados Unidos anula a decisão do Colorado de remover o nome de Trump da Cédula, que celebrou a decisão como uma "Grande Vitória para a América!" em sua plataforma Truth Social.


Por fim, é interessante somar a essa situação de alta rejeição dos principais candidatos a recente pesquisa feita pela ABC News/Ipsos que indica que 59% dos americanos acreditam que tanto Joe Biden quanto Donald Trump estão muito velhos para cumprir outro mandato presidencial. Todos esses fatores nos levam a possibilidade de um candidato de terceira-via receber mais votos do que nas últimas eleições.


Third Parties: Impacto e dificuldades

Embora os Estados Unidos possuam um sistema político bipartidário, há candidatos que não têm afiliação com nenhum dos dois principais partidos – Republicano e Democrata – podendo lançar suas candidaturas associadas a um partido menor ou como candidatos independentes. Essa alternativa de Terceira Via, conhecida como "Third Party" em inglês, nunca conseguiu reunir força suficiente para vencer uma eleição presidencial, sendo mais comum em eleições municipais e estaduais. No entanto, a presença da Terceira Via e sua quantidade de votos podem impactar os candidatos dos partidos majoritários, podendo até mesmo levar um deles à derrota.


Uma pesquisa da Fox News revelou que o cenário político no meio-oeste dos Estados Unidos pode ser diferente este ano. Embora haja um empate técnico entre democratas e republicanos no confronto direto, quando considerados os Third  Parties, a vantagem de Trump aumenta. Isso enfatiza o impacto significativo que os votos aos candidatos menores podem ter, especialmente se vierem de ex-eleitores de Biden, o que poderia prejudicar consideravelmente a candidatura democrata. Os três candidatos menores - Stein, West e Kennedy Jr. - são mais jovens que Biden e Trump, e embora não pontuem muito nas pesquisas, representam desafios para os principais partidos. Jill Stein, uma das candidatas, é crítica do bipartidarismo e recebeu votos significativos em 2016, enquanto Cornel West é um intelectual e crítico da área da filosofia e da política. Kennedy Jr., apesar de ser uma figura proeminente da família Kennedy, causa constrangimento devido à sua militância antivacina, embora tenha conseguido arrecadar fundos consideráveis e afirme que continuará na corrida presidencial.


Mesmo assim, o acesso às cédulas eleitorais para candidatos presidenciais de terceira via nos Estados Unidos é dificultado devido à complexa rede de leis estaduais projetadas pelos partidos Republicano e Democrata, que detêm o controle das legislaturas estaduais em todo o país. Enquanto os candidatos dos partidos dominantes geralmente são automaticamente incluídos nas cédulas de votação, os Third Parties enfrentam uma série de obstáculos, variando de Estado por Estado. Por exemplo, na Califórnia, um partido minoritário deve coletar 75.000 assinaturas de residentes dispostos a trocar de partido ou registrar-se pela primeira vez, enquanto um candidato independente precisa reunir cerca de 219.000 assinaturas


Segundo artigo publicado pela Reuters, estados como Nova York, Texas, Indiana, Virgínia Ocidental, Arizona, Flórida e Maine apresentam requisitos específicos e prazos rigorosos para inclusão nas cédulas eleitorais. Por exemplo, em Nova York, o governador Andrew Cuomo liderou uma iniciativa em 2020 que modificou a lei de acesso às cédulas, dificultando para partidos minoritários como o Libertário, Verde e Independente se qualificarem.


O poder do voto latino

Os latinos têm um impacto significativo na política da Califórnia, o estado que tem o maior número de votos no colégio eleitoral. Eles desempenham um papel crucial na consolidação da predominância democrata nas últimas eleições presidenciais, o que diminuiu a importância do voto  para o resultado geral de 2024. Agora, os olhos se voltam para estados como Nevada, que emergiram como estados-chave de balanço. Nevada possui seis votos no colégio eleitoral e tem sido decidido por margens estreitas nas últimas eleições presidenciais, com o candidato democrata vencendo por menos de 3% dos votos.


Essa é a essência do poder do voto latino: influenciar o resultado das eleições em estados altamente disputados. O voto latino muitas vezes se desvia das tendências gerais da população americana e de outros grupos étnicos minoritários. Embora seja difícil prever as ações e crenças individuais de um grupo tão vasto - com mais de 34 milhões de latinos com direito ao voto - é seguro dizer que historicamente esse eleitorado tem sido alinhado com o Partido Democrata. Dado que o partido tem enfrentado desafios de candidaturas de terceira via e outras dificuldades, a colaboração e apoio das comunidades latinas poderiam ser cruciais para o atual presidente Joe Biden em sua busca pela reeleição. Normalmente, isso levaria a implementação de estratégias políticas direcionadas às comunidades latinas nos Estados Unidos, visando atrair os votos indecisos e aqueles que poderiam considerar opções de candidatos de terceira via. O que acontece mais recentemente, porém, tem o efeito contrário para o partido democrata.


De acordo com um artigo da Reuters, a postura mais rígida do presidente Joe Biden em relação à imigração está testando o voto latino em Nevada. Muitos eleitores latinos no estado expressam sua decepção com o fracasso de Biden em expandir as proteções para imigrantes nos EUA ilegalmente.  Mesmo tendo prometido reverter as políticas de imigração linha dura do ex-presidente Donald Trump, Joe Biden adotou medidas mais rígidas, incluindo o pedido de mais financiamento para aplicação da lei e sugerindo que "fecharia a fronteira". Essas políticas visam apelar os votos dos moderados indecisos, mas correm o risco de afastar democratas mais liberais e alguns latinos.


Apesar dos esforços da campanha de Biden em destacar as diferenças entre sua abordagem e a de Trump, as preocupações com a imigração persistem, tópico especialmente importante para os eleitores latinos. Números recordes de migrantes tentando atravessar a fronteira entre os EUA e o México têm alimentado críticas republicanas, com pesquisas mostrando crescente preocupação com a imigração. A campanha de Biden acredita que sua base eleitoral dará prioridade a outras questões em relação à imigração.


No entanto, a postura cada vez mais rígida de Biden, incluindo políticas que lembram as de Trump, tem sido objeto de discussão. A presidência está supostamente considerando medidas adicionais para reduzir a imigração ilegal, incluindo o uso da autoridade executiva para negar asilo a mais migrantes na fronteira.


             As eleições presidenciais de 2024 nos Estados Unidos estão envoltas em incertezas políticas, com Joe Biden e Donald Trump enfrentando desafios consideráveis devido a altas taxas de rejeição e um cenário volátil. Surge espaço para candidatos de terceira via influenciarem significativamente os resultados, destacando a importância do voto e da participação popular. O voto latino emerge como um fator crucial, especialmente em estados disputados como Nevada. Assim, a sensibilidade dos candidatos às questões latinas é vital, sublinhando a necessidade de abordagem eficaz para garantir o apoio desses eleitores influentes em uma democracia vibrante.


[1] 235 deputados democratas, 199 deputados republicanos. 218 necessáriospara obter controle.

[2] 47 senadores democratas, 53 senadores republicanos. 51 necessáriospara controle, vice-presidente desempata.

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