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O novo governo Trump e a situação das cidades santuários nos EUA

Mayara Metodio Frota | 25/01/2025 15:12 | Análises
IMG The Trump White House

Cidades santuários são caracterizadas como municípios que limitam ou até negam sua cooperação em ações federais de fiscalização da imigração. Geralmente, elas possuem uma política, escrita ou não, que desencoraja a polícia local a relatar o status de imigração de indivíduos, a menos que envolva a investigação de um crime considerado grave.


São muitas as cidades que se consideram santuários, sendo as de maior porte, Nova York, Los Angeles e Chicago. Contudo, estados e condados inteiros podem se considerar santuários, como Califórnia, Colorado e Washington. À guisa de conhecimento, existem hoje, aproximadamente, 600 jurisdições de santuários em todo o país.


Primeiramente, é importante que se questione: de que modo se iniciou esse movimento? O desenvolvimento das cidades com a característica de “cidade santuário” partiu de uma campanha religiosa e política de acolhimento de imigrantes nos Estados Unidos, sendo Berkeley, na Califórnia, a primeira cidade a reivindicar esse status em 1971, uma vez que era considerada lugar seguro para os soldados da marinha dos EUA se instalarem após a guerra do Vietnã. Com o tempo, começou também a abrigar refugiados de El Salvador e Guatemala.


Nesse início as cidades se centravam, predominantemente, no apoio a organizações e movimentos religiosos, mas a partir da década de 1980 e 1990, sua essência passou a ser mais voltada a favor dos direitos humanos do que de questões propriamente religiosas, voltando o foco cada vez mais para o desenvolvimento de políticas que limitariam o envolvimento da polícia local a questões federais de imigração. Desse modo, esses Santuários, ao se oficializarem, se comprometeram a fornecer abrigo, proteção, bens materiais e, diversas vezes, aconselhamento jurídico aos refugiados, de tal modo de diversas religiões passaram a apoiar o movimento, como os luteranos, católicos,metodistas e judeus.


Recentemente, o número dos santuários continua crescendo, o que poderia trazer à tona a questão acerca de o que estaria camuflado no desejo de receber o caráter de “santuário”. Refletindo pela perspectiva dos direitos humanos, o ato de acolher imigrantes e ajudar com recursos materiais realizaria muito mais benefícios do que detê-los e deportá-los, e, após diversos estudos, essas cidades apresentaram resultados positivos como taxas de criminalidade abaixo da média, rendimento familiar mais elevado e taxa de pobreza menor do que em cidades não santuários. Vale ressaltar, porém, que nessas cidades não ocorre nenhum tipo de violação da lei; o que pode ocorrer é a recusa de funcionários locais à solicitação federal de detenção durante as considerações de deportação, seguindo suas diretrizes constitucionais e regulamentos legais próprios.


Acerca do governo Trump e em novas políticas de imigração, qual será a nova situação das cidades consideradas santuários? Analisando seu último governo, segundo a Federação para a Reforma da Imigração Americana (FAIR), desde novembro de 2016 (com a sua primeira eleição para presidente) o número de jurisdições santuário quase dobrou. Antes de sua posse, apenas 38 jurisdições afirmaram que se recusariam a cooperar com as políticas de fiscalização de imigração de Trump, enquanto, após sua posse, o número chegou a 236, anunciando que se recusariam a cooperar com o Serviço de Imigração e Controle de Aduanas dos Estados Unidos (ICE) e a Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA (CBP). No total, o número saiu de 338 no ano de 2016 para 564 em 2018.


Em 2018, o Departamento de Justiça dos Estados Unidos processou o governador e procurador-geral do Estado da Califórnia por 3 leis estaduais, afirmando que essas leis dificultavam o trabalho dos funcionários federais de imigração e impossibilitava deportar criminosos estrangeiros. Houve a promessa de retirar todo o financiamento federal distribuído para as cidades santuários, se tornando esse um tema-chave de sua campanha; assim ele emitiu uma ordem executiva (8USC 1373), declarando que as jurisdições que não cumprissem com ela não receberiam subsídios federais. A resposta a esse tema foi variada: 33 estados aceitaram a ordem e promulgaram legislações exigindo que as autoridades locais cooperassem com o ICE, enquanto outros estados e cidades afirmaram não cooperar com os esforços federais de imigração, exibindo até políticas de apoio ao acolhimento aos imigrantes. A Califórnia recusou abertamente essa ordem e dois municípios declararam que essa ordem era inconstitucional, emitindo uma liminar permanente nacional contra as disposições consideras inconstitucionais.


Desse modo, há dois polos em análise: havia quem se opunha às políticas de Trump dizendo que obedecer às ordens dos agentes federais de imigração minaria a confiança entre os policiais e as comunidades de imigrantes, enquanto o outro lado alegava que a proteção dos imigrantes contra a aplicação da lei torna as comunidades menos seguras e prejudica o estado dedireito. Por fim, essa ordem executiva de Trump não avançou como parte da Lei de Imigração e Nacionalidade, como esperado, sendo bloqueada pelo tribunal federal; ela foi promulgada como parte da Lei de Reforma da Imigração Ilegal e Responsabilidade do Imigrante de 1996, e também como parte da Lei de Dotações Consolidadas Gerais de 1997.


  Atualmente, o novo governo de Trump não promete ser diferente. Segundo a CNN, antes da reeleição, o presidente afirmava que, se fosse reeleito, pressionaria o Congresso a proibir as cidades santuários e daria poder às autoridades federais para coibir a imigração ilegal. Em um comício de campanha na Carolina do Norte, o recém-eleito presidente afirmou: “Hoje, estou anunciando um novo plano para acabar com todas as cidades santuários na Carolina do Norte e em todo o nosso país. Chega de cidades santuários”.


A partir dessas medidas prometidas por Trump, as cidades estão se mobilizando. O prefeito de Nova York, por exemplo, afirmou que “vai fazer ‘tudo que for possível’ para proteger os imigrantes que vivem na principal metrópole dos EUA”, e ainda ameaçou eliminar a lista de imigrantes indocumentados do município para que o governo não tenha acesso a ela. O prefeito de Chicago, por sua vez, garante que a cidade sempre será uma cidade santuário para os imigrantes. Vale ressaltar também Los Angeles, cuja população é composta em 40% por imigrantes e sediou um dos maiores protestos contra Trump após sua reeleição. Seattle, uma das maiores capitais e cidades santuário, afirmou que manteria sua política de abertura aos imigrantes. Por fim, temos Washington, capital dos Estados Unidos e sede do governo que, por contradição ao atual presidente, é uma cidade santuário, tendo Donald Trump afirmado sua pretensão de deportar 3 milhões de pessoas assim que fosse oficialmente empossado.


Tendo em vista todas essas razões, vale ressaltar que não há uma única maneira de lidar com essa situação. Há, por exemplo, a opção de se tornar santuários “silenciosos” sem anunciar suas políticas, de modo que evite atenção, o que, em contrapartida, não fará com que se resolvam os medos e receios dos imigrantes da comunidade. Outros lugares visam desenvolver recursos que apresentem os direitos dos habitantes, coordenando serviços, alocando fundos adicionais para o trabalho de defesa da imigração, rastreando e relatando os impactos humanos de deportações e abusos policiais, a partir da busca de recursos legais e do apoio aos protestos dos imigrantes e a políticas estaduais e federais mais humanas.

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