Com a quase totalidade das urnas apuradas nos Estados Unidos, já podemos extrair algumas conclusões dos resultados das eleições de meio de mandato (ou midterms). Contrariando expectativas, o desempenho do Partido Democrata foi melhor do que o esperado, enquanto o Partido Republicano (GOP) não avançou segundo algumas projeções políticas baseadas, principalmente, no descontentamento da população em face ao forte processo inflacionário que atuou contra a popularidade do governo de Joe Biden. Dessa forma, a “onda vermelha” que fazia referência ao crescimento do Partido Republicano no cenário estadunidense não se concretizou.
No entanto, a Flórida, um importante estado em termos políticos e econômicos, deixou de ser um “swing state” e tornou-se um novo reduto republicano. Este estado que antes votava tanto em democratas como em republicanos, elegeu muito mais republicanos, além de reeleger o governador republicano, Ron DeSantis, cujo nome desponta para confrontar Donald Trump na indicação como candidato republicano para as eleições presidenciais de 2024. A mudança do status político da Flórida se deve muito ao redistritamento que favoreceu o GOP e às posições anticomunistas de comunidades cubanas, venezuelanas, brasileiras e colombianas, entre outras. Ademais, é justamente nessas comunidades onde as “fake news” e as teorias conspiratórias estão sendo disseminadas em castelhano e em maior volume. Não é por acaso que os democratas estão investindo na formação de uma cadeia de rádio para confrontar a atual hegemonia dos Republicanos no estado, tal como noticiamos no Latino Observatory.
Os republicanos obtiveram o controle da Câmara por uma pequena margem, mas isso lhes garante a possibilidade de criar uma série de contratempos para o governo Biden nos próximos dois anos. O presidente já vem enfrentando diversos descontentamentos em relação ao seu governo, principalmente com a alta taxa da inflação no país. Sua popularidade está estancada abaixo dos 40%. Ademais, a corrida para as eleições presidenciais de 2024 já começam a ganhar forma e as estratégias estão sendo colocadas em jogo. Aproveitando esta situação, os republicanos já prometeram instalar uma comissão de investigação sobre supostas atividades ilícitas do filho de Biden, Hunter Biden, na Ucrânia. Caso isso se confirme, a polarização irá aumentar muito nos próximos meses.
Entretanto, para alívio dos democratas, eles conseguiram manter o controle do Senado, o que impediria, por exemplo, o avanço de um processo de impeachment que provavelmente será aprovado na Casa dos Representantes. A maioria já está garantida com o voto da vice-presidenta Kamala Harris, mas poderá se consolidar se o democrata Raphael Warnock conseguir manter sua vantagem no segundo turno das eleições para o Senado sobre o republicano Herschel Walker, em 6 de dezembro de 2022 na Georgia.
2. Os brasileiros eleitos.
Em meio a performance eleitoral acima do esperado, o Partido Democrata conseguiu eleger diversos imigrantes. Dentre eles, muitos latinos estarão no poder legislativo a partir de 2023, auxiliando na construção e defesa de pautas dos imigrantes. Inclusive, brasileiros irão compor o poder legislativo estadunidense. Tal como mencionamos em 2 de novembro aqui no Latino Observatory, quatro candidatos brasileiros que concorriam nas midterms em Massachussetts, três foram eleitos para o cargo de state representative e apenas Carlos Da Silva, que concorria para county comissioner, não foi eleito.
Os três candidatos eleitos fazem parte do Partido democrata. Dan Senna recebeu 74% dos votos frente a sua adversária, Cathy Clark. Em sua página do Facebook, ele declara estar muito orgulhoso de ser eleito e agradece a todos que auxiliaram nessa jornada. Da mesma maneira, Priscila Souza agradeceu nas redes sociais aos seus apoiadores e eleitores, declarando: “Tenho a honra de servi-los como sua nova deputada estadual”.
Enquanto os candidatos eleitos comemoravam em suas redes sociais, Carlos Da Silva lamentava ter perdido por uma margem tão pequena de 89 votos. Ele ainda afirmou que muitos apoiadores pediram uma recontagem dos votos, contudo, isso seria inviável tendo em vista as leis eleitorais de Massachusetts. O candidato também recebeu muitos comentários de sua base que expressaram o desapontamento com o resultado das eleições. Entre eles, o senador do Partido Democrata por Massachusetts, James B. Eldridge.
3. O que esperar dos três eleitos?
Nas mesmas cédulas que os eleitores realizaram a votação para os candidatos, também continha um plebiscito referente à lei que permite carteira de motorista para indocumentados em Massachusetts, uma pauta muito relevante para os brasileiros que vivem nos Estados Unidos. Priscila Sousa, uma das candidatas eleitas, realizou diversas campanhas para que as pessoas votassem a favor da lei durante as eleições, assim como Dan Senna, que realizou um discurso defendendo a importante conquista.
A campanha foi intitulada “Yes on 4: For Safe Roads” sendo realizada pela organização Driving Families Forward Coalition. Ela já tinha sido aprovada pelo legislativo, porém os republicanos conseguiram assinaturas o suficiente para realizar um plebiscito nas eleições.
Após a contagem dos votos no plebiscito, a lei foi aprovada e começará a valer no próximo verão no país. Com isso, temos uma noção de quais pautas os brasileiros defenderão em seus mandatos. Desde a campanha, levantaram bandeiras de defesa dos imigrantes e dos direitos civis e, por isso, é de se imaginar que mais pautas com esses aspectos entrarão nas agendas de seus mandatos eleitorais.
Dan Senna, por exemplo, realizou uma série de discursos desde que ganhou as eleições e participou de uma premiação da comunidade brasileira que vive em Massachusetts. Ele também compareceu ao 16º aniversário da Brazilian Chamber of Commerce, em português Câmara Brasileira de Comércio. Ele agradeceu os investimentos feitos as empresas durante esses 16 anos pelos empresários e empresárias.
Da mesma maneira, Rita Mendes participou de alguns eventos importantes para seu mandato. Ela foi convidada pelo ex-candidato Carlos Da Silva para participar da Reunião do Comitê Estadual Democrata de Outono, no qual teve a oportunidade de realizar um discurso. A recém-eleita também encontrou jovens imigrantes que acabaram de conseguir a residência permanente no país. Definindo ainda mais suas principais bandeiras enquanto Deputada Estadual.
Dessa forma, o mandato de cada um dos eleitos vai ganhando forma conforme suas agendas e as pautas por eles defendidas. Eles pretendem continuar trabalhando para defender o que acreditam e para realizarem aquilo que foi proposto. É de se esperar que os próximos meses serão agitados para os três eleitos e, até mesmo, para Carlos Da Silva que, apesar de não ter sido eleito, ainda desempenha um importante papel no Partido Democrata.
Filho de brasileiros, George Santos será deputado no Congresso dos EUA
O candidato pelo Partido Republicano George Santos venceu a eleição no 3º Distrito do estado de Nova York. Em sua plataforma eleitoral, ele prometeu garantir o “sonho americano” para outros filhos de imigrantes que vivem nos Estados Unidos. Filho de pai mineiro e mãe fluminense, George Santos nasceu e cresceu no Queens, em Nova York. Ele conquistou uma cadeira na Câmara dos Representantes nas eleições de meio de mandato nos Estados Unidos em uma disputa histórica entre dois candidatos abertamente gays concorrendo à mesma vaga. No entanto, conforme chama atenção a notícia do portal G1, Santos não é um defensor dos direitos LGBTQIA+. Suas propostas estão mais voltadas para a questão econômica e em defesa dos direitos dos imigrantes no país.
Segundo o website de campanha de Santos, ele afirmou: “Agora tenho a oportunidade de servir e retribuir à nossa comunidade. Acredito que a solução para muitos de nossos problemas em Albany e Washington é um governo menos burocrático. Todos os dias vemos políticos ativistas pressionando por um governo maior e impostos mais altos; todos os dias vemos um impulso crescente para o socialismo absoluto. A agenda radical da esquerda destruirá o sonho americano e a oportunidade para a próxima geração, nossa geração. Sou um republicano da próxima geração e estou nessa luta para trazer soluções de bom senso a Washington para sua família. Quero expandir as oportunidades para todos os americanos. Vamos consertar Washington e Nova York. Junte-se a mim na luta!”
O eleitorado latino e sua conexão com o voto jovem nos Estados Unidos
Conforme noticiamos em 27 denovembro, como saldo das midterms de 2022, os eleitores jovens, com menos de 30 anos, foram os que causaram maior impacto no desenho político na atual conjuntura política do país. Sua participação eleitoral foi o segundo maior nível de participação juvenil em pelo menos trinta anos, atrás apenas da eleição de meio de mandato de 2018. Como os latinos estão entre os grupos raciais e étnicos mais jovens do país, com idade média de 30 anos, saber as suas motivações e prioridades torna-se muito importante aos jogadores ativos no tabuleiro político estadunidense. Sabe-se até aqui, que a maioria dos eleitores latinos jovens votou em um candidato democrata no dia da eleição.
Um pouco diferente do que algumas pesquisas apontaram, que potencializaram o efeito da inflação enquanto decisivo do voto latino, o aborto e os direitos reprodutivos das mulheres também foram questões muito mencionadas entre a juventude latina, seguidos pela inflação e combate ao crime. Outros temas recorrentes, como assistência médica, mudança climática, moradia acessível, segurança nas fronteiras, direitos dos imigrantes, racismo e discriminação também apareceram como motivadoras na hora de votar, podendo variar em maior ou menor grau entre estados.
Como podemos observar, há propostas contrastantes entre os eleitos brasileiros, assim como diferentes perfis que jogaram a favor de suas candidaturas. Resta saber até que ponto vão considerar os anseios deste importante eleitorado que anseia por dias melhores enquanto imigrantes latino-americanos que requerem maiores direitos civis, políticos e sociais.